Psicóloga e Psicanalista • Consultório em Botafogo – RJ

A RELAÇÃO MÃE E FILHA

A relação mãe e filha é permeada de profundas ambiguidades. Freud, inclusive, alertou que não seria possível entender uma mulher sem considerar sua fase de ligação pré-edípica com a figura materna. Para a menina, é como se o Édipo não fosse absolutamente superado e algo resistisse ao longo da travessia edípica: um ponto inacessível pela linguagem, impossível de ser acessado pela memória – o vínculo primordial com a mãe.

A perspectiva Lacaniana acrescenta que a compreensão desse vínculo está para além do que pode ser circunscrito pela palavra e, ainda, que a problemática da relação mãe e filha diz respeito à ausência de um signo específico do sexo feminino. Nesse caso, a menina, por ser marcada por essa falta, espera que um outro – a começar pela mãe – lhe forneça uma resposta para o enigma da feminilidade. A controvérsia reside no fato – dificilmente aceito – de que essa resposta não pode ser concedida justamente porque o símbolo almejado não existe, está ausente. Para essa peça faltosa, tudo que a mãe pode proporcionar como traço simbólico é o falo – insuficiente para responder à questão. Essa falta de representação deixa uma parte da mulher sem respaldo simbólico, circunstância que lhe impossibilita a manutenção de uma “identidade” feminina.

Em “Deslocamentos do Feminino”, Maria Rita Kehl aponta que a mulher – a mãe ou quem a substitui – com a qual a menina inicialmente se identifica na busca de uma resposta para “o que é ser uma mulher”, é a mesma da qual ela precisa se separar e diferenciar para completar a travessia edípica. Ser mulher, portanto, é ser como a mãe e, ao mesmo tempo, tentar ser uma outra. É por isso que, em psicanálise, falamos que a feminilidade não diz respeito à uma reprodução de traços identificatórios e sim, é entendida como algo que é da ordem de uma construção. Ao procurar responder à pergunta “o que é ser uma mulher?” a menina precisará responder ainda outra: “que mulher sou eu?” Indicando que cada mulher se constitui a partir do registro do “uma a uma”, arquitetando para si, pelos caminhos da inventividade e da criação, a composição de um apoio para conceber sua identificação feminina.